O que fazes do teu tempo ?


No  fim do arvoredo e do tempo,
Não temas anjo negro ou cisne
Branco, ouve apenas o canto da alma,
Em que te enredas, fantasia

E brinca de dia ou de noite
Com o que te cerca, como queiras…
Em prováveis ou incertos caminhos.
Deles jorram milhares de grãos de areia

Em enormes mãos de vento.
Os ramos de veludo
Acariciam-te o pensamento,
Mas não saberás jamais o que dizem

E porque se demoram tanto
Na tua face, por todo o teu corpo,
Vestido apenas de tempo,
E por fim… indiferente a sorte,

Como um atleta acabado.
No fim de tudo,
É o desejo de alcançar algo
Que define na alma o teu caminho

Do ser (e o que fazer do teu tempo)
Tudo o resto será couto vedado
Ou simplesmente ficará por achar,
Como um livro fechado…ignorado.

Jorge Santos (08/2011)
Http://joel-matos.blogspot.com

Coração peregrino



Neste mundo com ódios, fronteiras,
E guerreiros a soldo,
Só o horizonte me sarava as feridas,
Por entre os azuis e o prado

E ao tocar nos silêncios e saliências  
De corredores e templos de lajes lúgubres,
Preenchia pequenas vielas,
Das sensações de anónimas aves.

O que tornava, nesse tempo, um seixo perfeito
Era olhando dentro, como quem contempla
E ouvindo atento com o peito,
O vento que vinha de lá…lá

Do fundo da vista, do sem-fim
De um tempo, que nem é de cá.
(Juro por Deus e por ti -em tudo o que vi
Viverei, desde qu’aqui dentro o não esqueça)

Neste mundo com fronteiras
Que vão desd’a íris na direcção
D’onde todas as sensações são estrangeiras,
Continua caminhando o meu coração.

Jorge Santos (07/2011)

Meu país breve


Vago sussurro me leva,
Através deste breve país,
Que nem me louva,
Nem me indulta, como juiz,

Mas condena à tristeza,
Como sentença do que não fiz,
(Valia mais cear com o demo à mesa,
Tão bastardo como estas leis).

Breve sussurro me leve,
D’outra e outra vez,
Breve e branco como neve,
Pisada por meus pés,

No silencio de quem não me ouve,
No rumor débil que hasteio,
Ao ouvido de quem não me vê,
E ao meu olhar raro e alheio.

Vago sussurro me leve,
Nas vagas leves, nas marés
Do destino que m’envolve,
De heróis e almirantes.

E assim vogo entre desencantos,
Amores e saudades d’antes,
De migrados nostálgicos,
E exilados, outrora senhores,

De terras e campos.
Breve sussurro me leve,
Ao régio do que fomos,
Nas penas da mais famosa ave,

À  herança que perdi
E á memória d’elefante,
Tudo o que era antes, eu esqueci,
Excepto que não sou, de todo, inocente.

Jorge Santos (05/2011)

A sensação de ter vivido devagar


Não tenho da banal pressa nem sequer o vagar
Nem quem se ofereça pra falar por falar
Não sou de conversa “fiada”ou ocasional
E nem por nada me considero pessoa “normal”

(Quero lá eu saber o que isso é!)
Diziam-me que, “seria o que eu quisesse!”
Nem me lembro de ter esperança, nem quando era criança
E diziam no jogo do berlinde “marralhas pr’ás meças...”

Se nem pr’ás “moças”era “o primeiro que se namora”,
Invisível até para a professora,
Enchia a sala de aula de fedor ao vulgar, ao pobre...
E de gargalhada geral, daquela que açoita e fere.

Era anti-social e desconfiado, um fósforo apagado
Num espaço exíguo dobrado sobre si mesmo, ouvindo
O terrível silêncio no latejar das minhas veias.
E o que faço eu desta profissão de ideias?   

-Evoco o que esqueci, como um vómito seco,
Ou talvez a conversa calada em que me fico,
Não tenha pressa de mais nada,
Talvez nem conheça a sensação de ter vida,

Tal como a conheço agora…

Jorge Santos (05/2011)

Veias do meu rosto




Correm lá fora, veias que desconheço eu,
Sem outro sentido para mim, senão os dos ventos
Que vêm e vão num sussurro de quem se perdeu   
Na distância, ouço-as por entre os maus pensamentos

E nos meus ouvidos amplos de paz e solidão,
Não me interessa outro ser por companhia,
Se nem conto tão-pouco com o meu coração,
Que me censura, em vão, desde o primeiro dia,

Não encobrindo o ar de desapontamento.
Se eu pudesse ter na vida, a alegria
Que têm as veias que correm lá fora, neste momento,
Até com os ventos corria e ria…ria,

Iria, desde o nordeste, até ao barlavento,
No entanto, sinto uma dor na nuca e um travo de boca,
Que se espalha pelos ossos todos e nas maçãs do rosto,
A dor que deve ter, (penso eu) quem a vida hipoteca,

Ou então alguém que, de bravio tem coisa pouca, quase nada...
Correm vidas lá fora que desconheço,
Poderá a alma que conheço, ser também levada,
Pró’além, de que falam e eu não conheço...não conheço ...

Jorge Santos (04/2011)

O sonho que se opôs a que eu vivesse,


O sonho que se opôs a que eu vivesse,
Se viesse ver-me, na cinza fosca do inferno,
Veria que nada de novo acontece
E nem nas pequenas coisas eu m’empenho,

Na esperança que quis que eu acordasse,
Com os olhos cegos dos enigmas que abarcam,
No medo e na dor me vence, pois é a de quem nasce,
Sem começo, nem a casta certa dos que por cá andam.

E no amor fictício, como se este nunca acabasse,
Do qual falava e o qual invejava, 
Por não ter por quem o sonhasse…
Fiz da pouca fé, minha escrava e serva,

 A glória eterna, vandalizei-a na face,
E vi, na cesura pálida, os que morreram,
Sem nome, sem que a memória descrevesse,
Quanto de quantos sonhos, sonharam eles.

Jorge Santos (04/2011)

Ralhos dest'alma


Emissário de um rei desconhecido
Depus no trono um outro dono, sem trégua
E pouco a pouco também fui desprezando
A entrega, missão assaz vaga e de má paga,   

Onde eu cumpro informes instruções de além,
Inconsciente no meu olhar inquieto, distante
E disperso, grito repetidamente por ninguém
Não por aflição, esperança tocante ou morte

E às bruscas frases que aos meus lábios vêm
Reagem agitadas as maldições e as inúteis teorias
Como ralhos que d’esta alma elíptica provêm,
Por isso, as deixo repousar, dormentes, fugidias…

Soam-me a um outro e anómalo sentido...
Dissipadas no anel de nimbo que guardei intacto
Missiva a um rei outro,mudo, conhecido
Do céu estrelado que visto em segredo, como hábito.

Jorge santos (03/2011)

O dia em que o eu me largou





No dia em que o eu me largou,
Arreiguei um cargo desnecessário,
160 Graus/leste, (a meu ver) antónimo
Da noção de básico e sem préstimo

E onde o ermo é o meu elemento supremo,
Cansado do ser que eu próprio sou,
Cem por cento anónimo e néscio,
Tomei a paz como acessível confessionário,

Não, que não queira o sentir que possuo,
Mas não aprendi a ser mais espontâneo
Nem no vigésimo dia em que o eu me largou
Actualmente confesso não ter fé num novo cenário

E ainda penso no sossego do sol tardio,
Como a resignação perfeita do final do dia ,
E uma visão do mistério que não controlo,
Mas tento manter o essencial d'ele ao colo,

Apesar d’ uma crença orgânica num novo eu.

Jorge Santos (03/2011)

Tenho escrito demais em horas postas...



Tenho escrito demais, em vulgares gotas,
De que jorram gastas, comuns coisas e lugares,
Umas menos claras, mas todas apáticas
E feitas de maus versos, verbos regulares

E colagens, enxertos d’ textos, teorias
Outras realidades que conto, iguais exteriores,
A pretexto de serem partes de flores, velhas
Espécies, raras ou horrores, por isso mesmo seculares

Confundi-as c’os cometas, d’ caudas devolutas
Destes Debates, dessas diluídas luzes
Mortas, enigmáticas, alheias, hepáticas
Notas de, efemérides e depostas vozes

Onde me exprimo! Nas opostas letras…
Emocionais? Intensas? Letras sem pés,
Tantos símbolos, Tantas escritas, tantas vidas
Por quem sou ademais estranho e aprendiz

De diversas forças, antagónicas e desesperadas.
(tenho escrito demasiado e sem gosto, indecentes
E perfeitamente alinhadas coisas, breves, inoportunas,
Tantas as que gostaria de falar, com os meus mestres

E ser o pó nas estradas, deles pisadas, veias,
De gotas fantásticas e nem sempre iguais a docentes
Riachos correndo, regulando, por d’entre, as enxurradas)
Todas as teorias minhas não passam disso mesmo, magras flores,

Onde espeto fragmentos de dizeres d’outros em obras póstumas.

Jorge Santos (03/2011)
http://joel-matos.blogspot.com



Nasci onde as ondas do mar se calam



Nasci onde as ondas se calam nas pedras,
Onde a fala se confunde co’mar,
Vinha de manhã cedo pra brincar,
Com os seixos que docemente me falavam,

(Como quem delega num filho um segredo),
Num lugar secreto onde tudo era tranquilo,
O rolar das ondas quedava ainda mais lento,
Lavava por dentro o meu coração,

Num leito de calhaus polidos,
Ia até onde chegava a maré cheia,
E ali ficava, calado, na tarde, esquecido, pasmado
Com a doçura de sal e lábios e areia,

E nas palavras, que de noite emudeciam,
As promessas que o mar me desse
E os sons que na noite falassem deste…
Quem me dera que nunca fosse

Acordado p’lo mar embrutecido,
Mas, se ele me desse um búzio, (mesmo pequenino e partido)
Eu ia embora mas não mais deixaria
De acordar de manhãzinha e bem cedo,

Pra nele colar o meu ouvido,
Mesmo que fosse viver longe do mar,
Ele estaria sempre ao meu lado
Porque nasci onde o sal se me colou na pele

E não me canso de ouvi-lo falar, (do mar)…
Qual quer que fora o seu rugido,
É eterno e terno ao meu ouvido.

Jorge Santos (02/2011)

Filhos do não


Ainda que, nos ombros suportem a Terra,
Os milénios e durem meros minutos ateus,
E, tão de noite seja, que de manhã nem descora,
O tinto vinho, da taça despejada de Deus.

E os réus, os que Te servem frio e morto,
E se comportam como filhos do não,
Condenados a partilhar de golpes no rosto,
Dum Cristo, a náusea e a nua paixão.

Ainda que pese sobre as Tuas costas,
Esta Terra cinzenta e estreita,
Ainda que homens ajam como bestas,
Ou feras cativas, sempre à espreita,

E os venenos destilados em taças,
Sirvam de ampulhetas dos restos do tempo,
Ainda que seja absurdo que sofras,
E voltes a assentar a cabeça, no herdado cepo

E a apodrecer no jazigo raso dos soldados gregos,
O silêncio do cosmonauta cantará nos teus ombros,
Até doerem os címbalos  outrora surdos,

E a luz de muitos sóis, perdurará nas pálpebras fechadas
Ainda que encerres os teus deuses dementes,
Longe das manhãs breves e nas tardes luzentes.

Jorge Santos
(02/2011)

Amo porqu'amo...


Amo porqu’amo, pra ser exacto,
E, se criei um tampo e um palco,
Entre a razão e o peito,
É por’c’amo tudo a temp’inteiro,

E, se sei d’amor, o q’este m’ensinou,
Enfim, o resto aprendi , d’vendo
Ao corpo a ilealdade,
Com a qual me complemento,

Embora esta se me não adapte,
Como uma “amigalite” íntima,
(algo que não tenho nem existe)
E ao espírito, no estilo d’escrita.

Não me compete a mim banalizar,
Ainda mais essa coisa,
Que traio no pensamento,
E no copo, fica sempre por acabar,

Mas, quando estou inspirado,
Pespega-me um prazer intenso,
Próximo do orgasmo,
(Doce, mas sem acto)

Dia perdido, vida perdida, indistinta,
Mas, a minha imensa
Desilusão, encontrou um sabor novo,
Pra mim, inédito e físico, Amo…

Não o abstracto, mas o real …

Jorge Santos (02/2011)

A raiz do nada



Cai a chuva do nada,
Constante, tecida,
Cai a chuva na face,
Como que s’oferece ,

Resignada, leve.
Cai a chuva do nada,
Nesta face breve,

Neve adormecida.
Cai a chuva na face,
Como que s’oferece,

Resignada e leve,
Cai a chuva do nada,
Tolerada e leve,

Flutua numa claridade
Ímpia, embebida
Num suave doce.

E eu, que choro
Inúteis rios,
Mortos de sede,

Soro escuro,
Atravessado de vazios
Desenhos na parede,

Em estuque sujo, frio.
E eu, se pudesse beber,
Deixaria de ser raiz
Soterrada.

Jorge Santos (02/2011)

Ponto sem nó


Nó e ponto, em sequência e igual a todos
Os invadidos de uma senilidade fútil qualquer,
A modos que formatados a zeros,
Sem nada de orgulho oculto pra um Deus leigo entender.

Cumpro uma missão que não entendo,
A mando d’um ser supremo que desconheço,
Nem sei qual é o meu fardo,
E qual o meu preço,

A roupa que visto, não é minha, nem a teço ou faço,
Uso-a por adereço, escondo debaixo o sujo
No corpo, igual a tantos outros, assim me disfarço
E consigo conviver, imundo comigo e camuflado co’meu nojo,

Comprovo-me ao sol e debaixo dele sei por vezes q’existo,
Quando m’afundo num corpo bonito de mulher
E, se ungido sou, do sangue vindo dum incerto Cristo,
Ele olha-me severo, da cruz, sem nada dizer, ou fazer

E o que vejo, no espelho, é uma revelação
Triste d’outros rostos, de esquecido rasto,
Não me orgulho, nem um pouco, da humilhante missão,
De carregar na pele, um número tatuado, a ferro e fogo.
                                                                                                                                             
Ofereço-me no patíbulo, a custo zero, e não me enfureço,
Se amputado dos sentidos ou fuzilado por me traír, reduzido a um pó,
Que dizem ser, poeira dos anjos, disso não me convenço,
È apenas o supersticioso espírito, fazendo troça, dum simbólico corpo,

Sem culpa, se faço parte da miragem de mim mesmo,
A imortalidade será um mito mágico, infantil,
De que adoeço amiúdo com o febril sonho de que sou de mim senhor e amo,
Mas, tal como quase toda a gente, sou ponto sem nó, i sem til

Nem fúria nem vitória, ponto.

Jorge Santos (01/2011)

tradutor

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