Subtil ….



Subtil o que sofro,
Quero sentir de outra forma pois sinto
Em forma de nada o meu querer,
Falta-me o oscilar do salgueiro ao vento,
Falta-me o sonho dentro do sonho,
-Fala-me da realidade curva e as cores,
Da forma que tem o tempo sem ter,
Em forma de álamo o meu querer …
Paisagem num quadro, uma subtileza
Em cristal, um átomo a oscilar no tempo,
O espaço, um intervalo nulo, o meu ser
Embala-me no vulgar soprar – o ar,
Poeira inquieta o que tenho e não quero,
Milimétrico eu, vulgar sopro o que penso
Ser viver neste viver sem vida, que quase 
Toco sem que me toque ela outra …
Falta-me a sensibilidade negra do corvo,
Fala-me da ausência e da conclusão do dia,
Da hora tardia, fala-me da promessa
Não cumprida, do sermão e da dúvida 
Necessária pra nos mantermos espíritas
E em forma de ar, o nosso ser sitiado,
Enfermo e em forma de nada mais 
Que ar e ar, de mar cercado e sem saída.
Quero sentir-me de outra forma que não preso
Ao corpo nem à vida, sútil ao sopro,
Subtil é o que sofro.

Sofro por não ter falta ,




 
Sofro por não ter falta,
Ausência se faz sentindo
A mesma falta, a partir
Do que não é preciso,
E só dói ao principio, 
Eu sofro por não ter falta,
Medito a sós comigo, 
Repetindo o mesmo “mantra”,
Vezes e vezes sem conta,
Ausência só faz sentido,
Quando há em uma parte
Do corpo, transição.
Eu sou um quarto do caminho,
Desconheço os fins
E a distância, a atitude
É uma doença contagiante, 
Congénita, tal como a má morte,
Estou morrendo de conteúdo,
Como morre mudo um pato,
De desmérito, pode ser fraca
E inoportuna ou tamanha, 
Sofro por não ter falta,
A felicidade é rara e falsa, a alma não
É minha …nem é dada à sorte.
Sofro por não ter falta,
Finjo, ignoro, sou feliz
Como quando se nasce,
Ausência se faz sentindo,
A morte não se sente,
Embora faça parte do que sinto,
Falta-me do voar a asa e a verdade,
Os deuses não me deram uma,
A outra não a quero,
Não me cabe escolher qual delas minha, 
Sofro de não ter falta,
Sofro de ser agora, já tarde …

Temo as sombras e o burburinho …




Temo as sombras e o burburinho … 
Temo as sombras e o burburinho, 
Temo este mundo e o outro, 
O novelo sem roca e obra feita,
Temo o que é invisível e o que vejo,
Novela, enredo, falso pergaminho,
Levitável o monge de Damão na Índia,
Lamentável a minha condição,
De temente a Deus e não aos espaços
Grandes, quanto os desses. 
Miseráveis as palavras que deixo,
Temo o burburinho e as ombreiras
Das portas, as ruas aos “esses”,
Às vezes surge-me na ideia, o que
Estou sonhando e quase toco 
Nos sons do outro lado, embora
Seja uma sinfonia complexa, 
E os anjos tão reais como qualquer
Um de nós, anunciando o privilégio
De serem divinos, seremos quem 
Nos representa, a obra feita,
Salvo o facto de existirmos,
Entre sombras e burburinho.
Sombra de choupo não é mogno, 
O vácuo não tem consciência de broca, 
Nem a esperança é negra,
Como eu dizia inda agora plo caminho,
Por mais que pertença a este, 
Sinto o outro, não o repudio…

Ridículo q.b.




Há música na palavra dita…
Há música nas palavras ditas,
Não ouso cantar
Em publico, sinto-me ridículo
Quando dou por isso,
Estou a cantar alto sozinho, 
pois que o hábito não faz
O monge e eu canto como maldito
Da rua, embora não seja cego,
Sou louco quanto a loucura
Que me habita por dentro,
Sendo esse o meu desatino,
Quando dou por mim sozinho,
Cantando baixo, baixinho.
Sou ridículo, sinto-me músico,
Sem ser nem isso, q,b.
Um sem ofício, fulano tal,
Maldigo o ruído que faço,
P’los cantos da boca sujos,
Como se não bastasse sab’a gemada,
A língua batendo constante,
Nos dentes fingindo ser harpa.
Trinta destinos tive à escolha,
Nenhum de ser poeta, quanto
Menos músico eu, etc, etc, etc …

Tenho sonhado desperto …





Tenho sonhado muito,
Tenho sonhado desperto,
Estou cansado de sonhar
Mais que ninguém do mundo
Ou deste perto, desespero,
Resta-me tentar dormir,
Ter todos os sonhos do mundo,
Recordar acordado certos sonhos
É esquecê-los
Porque esquecer é recordar de novo
Depois de ter sonhado tanto,
Tanto tempo acordado
Mais que alguém no mundo
Deste lado, desespero
Tanto mais que ninguém sonha 
Sonhos perfeitos dormindo,
Desperto …

A verdade é Tenente …Tio Lawrence.



Teu “Lawrence”
O viver Almirante, 
A verdade Tenente,
Capitã minh’alma,
Venho ao mundo
Temente, tamanha 
A sede de viver, gigante …
Almirantes, todos
Que o mundo possa
Conter, dementes vivamos
Capitães da areia,
Fundeemos castelos,
Quer sejam ou não âncoras
De verdade, nem os barcos
Rabelos, os portos-Porthos,
Dromedários, caravelas, deserto.
Teu “Lawrence”, tio Lawrence…
(Vontade Tenente)

Como paisagem ao morrer o dia, o voar do ganso…





Como paisagem ao morrer o dia, 
Tudo se esconde em sombra e erva esguia, 
Assim parece o tacto e o chão ermo
E falto, que me larga a mão e parte 
Na passagem do fim, para o norte fundo,
A chuva não vem longe, vem de través, 
Me segredam os dedos, ralos os cabelos
Que penteio, por dentre dez mil deles, redondos
Como a paisagem, o horizonte e a morte
A chuva não vem longe, acredita profundo, 
Acredito nos homens que não morrem de vez,
Acredito que o “Homem” não morre hoje,
A Terra está doente, não me embala
E eu sofro pelo mar em volta e em luto,
Pla Terra, pla flora e a chuva não vem, 
Nem chora, assim padecem meus olhos doendo,
Doente, eu e tudo, tudo se esconde 
Em sombra e erva podre,
Como paisagem ao morrer o dia, o mundo
Enfermo, tal como entre duas espadas
E o punho, a parede de ferro e brasa,
O feno, o funcho, o abrunho, o ouriço…
O voar do ganso mudo. 


“Entre duas aspas”





Ficarei a ser, sendo o que entendem que digo,
E de mim, enfim é o que consigo dizer entre
Aspas, digo-não entendo tanto quanto quero-
Porque haveria de querer eu, seria sério sendo,
Isso não sou, por aí não vou, passarei por 
Mímico, sendo o que não sou, – entendem
O que digo, pois eu duvido mesmo a sério
Da minha certeza toda e aposto na duvida,
É um vício o ser quem não sou, a razão 
É simples e natural como todas as coisas,
É o que consigo dizer não dizendo, “dividando”
O seno pelo humano interno intenso, sendo
Ficarei a ser o que entenderem que sou,
Gradiente de cinza, incompreensível voo
De moscardo sem voo, necessidade de nada
Ser, destino imaginário ou o que possa ter
Entre aspas “à míngua desse dom”, seco, indivino. 
Perdoai-me, pois não me entendo nem m’dispo
Quando por vezes me “desdigo”, “dividando”
Seno Coseno hipérbole, eloquência de Fibonacci
“Pro bono”, contradigo-me sendo o que não sou, 
Dando o que não tenho, ocultando por onde vou
Paradigma este sentir sem ser voar sem asas ter
Lembrar pra esquecer passar sem mudar pés
Nem mãos do lugar suposto que ocupo na sala
Menos-oval do mundo, enfim, é o que consigo
Dizer “entre duas aspas”, entre duas águas
Sinto que entendem não de facto, o que digo …

Que será da nossa viúva sombra,




Que será da nossa 
Viúva sombra, sem
A mortal vida presa,
Que somos, criamos

Poesia, como deuses
Do cosmos, querendo
Sou iníquo ou único,
Como se existisse “Ecce Homo”

Em mim ou uma luz negra
Assim, tal como há vida
Em nós, contamos com
A morte, pra sermos

Eternos e reais “d’cem-réis”, 
Que será da nossa 
Viúva sombra,
Sem o lugar dos tordos,

Os Maias, os Césares
E a vizinha cega, que
Não sei o nome…
Que será da nossa sombra,

Morta a vida, cega …cegos,
Vivamos todos.

Jorge Santos 08/2018
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Gostaria de ter um Cadillac novo,




Gostaria de ter um Cadillac novo,
Daqueles verdes vivo ou claro,
Assentos cor de ovo, a casca
Ou da minha pele morena,

Gostaria de ter um Cadillac,
Como outra “gente bem”, 
Aquele que reproduz 
Um trovão quando passa rente,

Sem esforço, plo meu coração
Parado, aquele que não afrouxa,
Como tudo na vida e enfim,
Como toda a gente comum,

Que gostaria de ter um Cadillac
Novo, mas sou cercado de coisas
Incompletas, assim os jardins,
Onde pobre me deito e ouço as rosas,

Sorrir nas pétalas, Dálias do Japão
Sedan Azul na América do sul,
Correr cidades e subúrbios,
Gostaria de ter um Cadillac novo,

E esta intenção de me encontrar suposta,
Esta inquietação de correr cidades de costa
A costa. Tornar parte da paisagem
E do ruído metropolitano, dos rostos humanos, 

Esta intenção de me encontrar em tudo,
No ouvido dos vizinhos a falarem alto,
No trânsito do subúrbio, sempre parado,
Ao volante de um Cadillac-de-fazer-vista.

Jorge Santos 08/2018
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Puder-eu-o-ter






PUDER-EU-O-TER




Mar que há em mim,
Puder eu o ter não no lugar
Que tem o mundo, mas no peito,
Profundo, perdido e fundo.

O mar que há em mim passei,
Saudarei da margem dele 
O mar sem farsas falas, pois 
Que hei-de por ele passar,

Eu sei que é o mesmo 
Porque me corre nas veias 
E é salgado tal e qual o sal
No mar imerso e imenso.

Abraço o nosso e o falar
Que não se distingue
No mar entorno que volta fatal
E eu vou ao ritmo da maré,

O mar que há em mim
É supremo, confesso-me
Imperfeito não me alimenta
A beleza, não compreendo

Os elementos nem o critério
Da natureza, da espuma, 
Apesar de fluída e me aperta
O peito, estéril, amiga,

Ouvir o som das águas
E morrer, é como descrever
A própria calma e saltar
Dos ribeiros para o domínio

Que me corre nas veias,
O destino é sentir que vou,
Sem deixar de ser o mar
Que volta e me tem, puder-eu-o-ter,

Confesso-me …

Jorge Santos 08/2018
http://namastibetpoems.blogspot.com

Jaz por terra...




Jaz na Terra o sossego e a negação do belo,
Jaz por Terra a noite e a ferida em cal-viva,
A ventura que é sorrir e também chorar gelo,
Jaz na terra o trono e um dono senhor de tudo,

Jaz por terra um templo que abandonei e que
Descuido, por não ter uso nem deuses, esses novos,
Infecundos e impostos para mal do homem feudal,
Homens deuses, a quem a calma e o ódio Deo-opus

De-graça, como se fora eu sacrossanto ermitão,
Em “Cristos Bay resort”, jazz por terra o meu ego,
De campeão dos detestados feios de braços, 
“Sou tido” como demente por sentir tudo,

Até quando chuva quando cai na Terra quente, 
O meu coração me desmente e me desdiz, 
Jaz na Terra o sossego e a negação do belo,
Jaz por Terra a noite e a ferida em cal-viva,

A ventura que é sorrir e também chorar gelo,
Jaz na terra o trono de um dono, senhor de tudo,
Apesar de tudo isso sou tido como pouco são, 
Por sentir mais que tudo e tod’esta gente,

Quando a chuva cai em meu coração não mente,
“Sou tido” como demente por sentir tudo,
Até granizo quando cai na Terra quente,
No meu coração d’pedra faz frio de geada,

Jaz nele a terra, o céu e o abismo sem fundo,
Jaz na Terra o sossego e a negação do belo,
Jaz por Terra a noite e a ferida em cal-viva,
A ventura que é sorrir e também chorar gelo,

Jaz na terra o trono e um dono senhor de tudo,
Apesar de tudo isso sou tido como louco,
Por sentir mais que tudo e toda a gente,
Quando a chuva cai em meu coração dormente,

Como se fosse real e sentida, credível talvez,
Embora nem sempre…

Jorge Santos 07/2018
http://namastibetpoems.blogspot.com

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