Prefiro rosas púrpuras ...





 Prefiro rosas púrpuras

Prefiro rosas, papoilas, a morrer por algo
Que não posso definir realmente,
Nem sei explicar o sentido, o modo
E a doçura, o relevo das folhas, o ópio

É a saudade que tenho das roseiras bravas,
Pintadas como se fossem curvas figuradas
Dedicados a alguma encarnada Deusa egípcia,
Fazendo de conta que existiu por mim,

E que eu próprio criei, embora seja também
Minha por direito de irmão, a única verdade
São os meus cinco sentidos saudosos,
Daí a lembrança dos espinhos verde-sangue,

Os que não cultivo e os cultivados,
Menos reais que os pinheiros azuis mansos,
E as cores do campo, únicas e com
Suave gosto a flores sem serem

Realmente isso, é tarde para morrer
De novo de amor humano, tal a minha
Devoção às flores do campo, relvados, tingidas
De vermelhos e brancos, rosas-papoilas,

Mirtilos, framboesas, diospiros, fresas,
Prefiro rosas a morrer por algo fora de mim,
Como se fossem malmequeres dos meus instintos,
Guardo-os, guardava-os onde se vissem melhor

Por dentro, assim me vissem ind’agora
Sofrendo do que não sei explicar,
Pode nem ter solução, remédio a esperança
De entender a vida com a definição das rosas

Púrpuras, se desfazendo uma a uma, sorrindo
Pétala após pétala, ironia do absurdo
Parecer realidade o facto falso e a versão
Fictícia, imitando o natural, o ruido e no fundo

A transcrição exagerada das rosas,
Representa o meu estado real de alma agora,
Despido do que me contraria e do que esqueço,
Do que havia, prefiro rosas púrpuras a cactus.




Jorge Santos (31 Dezembro 2020)

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Me perco em querer




Me perco em querer,
Um querer sem perca,
Não é melodramático,
Definitivo e comum

E eu sou um banal
Costureiro, faço da
Rotina um “bem-estar”,
E do estar “mal-uso”,

Substituo a prática,
Dos gestos, pela ideia
Que deles tenho,
Fundamentalmente

Sou um engenheiro
De indisciplina interna,
Realizo-me irrealmente
Como fosse um vicio,

Que não quero querer,
Sendo eu o querer por
Defeito e por sevícia,
Não posso perdoar-me,

Me perco em querer,
Sem querer exatamente
Nada, tudo me foge,
Tudo se me desagarra,

Inclusive a sensação,
Quando é pensada,
De querer alguma coisa,
Infindavelmente pura,

Infinitamente alta,
Como um pôr-de-sol,
Redondo em Malta,
Curvo em Alepo, Gaza,

Granada, peco inclusive
Por não querer-nada
Fora eu mesmo, indesejado
Por decreto-lei, recuso-me

A estabelecer acordos,
São simpatias falsas, pouco
Práticas, uma maçada
Que excluí dos meus hábitos,

Não quero o que outros
Possam querer, a astúcia
Não é “o meu forte”,
Nem a paciência se dá comigo.




Jorge Santos (14 Dezembro 2020)

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A sismologia nos símios





 A sismologia dos Símios

ou a Cola do Tempo



Eu queria ter sido os outros,
Que fazem poesia de frase certa
Como quem charrua o tempo, grada
E cola o espaço à terra, o eco grave

Sem ser por motivo algum, algo
Dimétrico, o mero perecer das coisas,
O enlouquecer, a perspetiva, o dever mudo,
São a cola do tempo, o orgasmo,

A simbiose dos símios nos primatas,
Que somos nós hoje, o simples
Entediamento dos homens, eu queria
Ter sido dos outros sítios fragmento

De manto em forma e textura e sentir
A sintomatologia dos sítios por onde
Passa a fé humana, do pó à pedra, à lâmina,
A sismologia dos símios em monarcas,

Tendo nas mãos não ceptros, mas pás
Eólicas de moinhos de vento, paz …
Eu queria ter sido dos outros, Seixos
Que partem para a guerra vesgos, cegos

Culpados de serem chama sem terem fúria
Ao lado dos outros que vêm das guelras,
O sustento, o tempo, o gozo a cola e os planos,
O X fundamental que é o da vitória

De humano contra humano, a história
Do tempo, pequena, concisa e a cola
Que cola o espaço ao eco, à Terra
Incorpórea, errante e cansada.





Jorge Santos (12 Dezembro 2020)

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Perdida a humanidade em mim




Perdi a humanidade,

Perdi-me da humanidade, não me posso achar mais nela,
A crescente nitidez em mim é igual a um um azul sem cal,
Olhos de perdiz em que os sonhos não se perdem, 
Acrescentam o que vi em vida, vejo que me perdi desta gente,

Me perdi da humanidade e de tudo quanto fui e sou, agora nada 
Me pertence, nada me vence, nada me acaba senão o despertar 
De vez para cento e uma mil formas de ser que não havia
Em mim, isso me inclui sem dúvida num céu que perdeu o tom,

Deixai-me ouvir intenso o que não posso ver, o que nunca sonhei, 
O meu próprio ser outro, não ter pensar como raiz d’pedra greda, 
Desejos inúteis são pesos, vulgares apêndices, fálicos pesos
Ou fábrica de fúteis contas de efeito hipnótico em embalagens

De realidade em formol que não têm espécie alguma de sentir, 
Nem nenhum elemento espiritual essencial, desses sem peso, 
Nem preço, nasci para criar o que outros talvez não entenderão,
Estados de alma, projecções de ideais abstratos, ilúcidos,

Embora nítidos, todo o esforço foi em prol de separar-me 
Do que sei e do que se ergue diante do meu passo de vista 
Curva, visões e desarrumo, enquanto eu legitimo o céu 
Solto, depois de retirados os castros e eunucos castelos

De praça quadradas e antigas, grandezas provisórias, 
Sem alma, semelhante ao som de veículos de ferro 
Chapa e solda, esquadrões da morte de um exército inteiro, 
Desertado, coberto de alcatrão viscoso e palha solta, pregos, 

Perdi a humanidade, o andar é um esforço em falso 
E pode ser que nada valha, sei que  ainda não é o fim 
Nem o princípio do desencanto, o mundo, é apenas tardio,
Os lusíadas um conto, Inefável é o que não pode ser dito

De verdade, Nem na sucessão dos deuses haverá Híades, 
Princesas como promessas por cumprir, tratados “mundis”, 
E esta humanidade sem comprimento nem encanto,
perdi-me da humanidade e de tudo quanto fui, agora nada sou,

Nada me pertence, nada me vence, nada me acaba,
Perdi a finalidade “ao-que-vim”, Perdida a humanidade
Em mim …




Joel Matos ( 04 Dezembro 2020)

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Em pelo ou em galope.





Deixem-me sair e ter comigo, uma conversa a dois,
Em que seja eu senhor do meu domínio, ruim dono
D'mim mesmo, Alcalino quanto o vento que sopra escuro
Quant'o vermelho duro que tenho na face severa, cara de povo,

Não interessa, que me deixem sair velado, aziago,
Ir ter comigo na liça, na clareira do mato vetado, encoberto
Subjacente ao bosque da bruxa, porque estou convicto, certo,
Qualquer coisa, em mim, benévola e residente,

Me desatina a enfrentar a morte, andar léguas
A-monte, descalço sobre carqueja e giesta, urze, restolho,
E linho, em pêlo e a galope numa besta roubada, folhas
De couve e bolotas, curcuma, azia e diarreia, sede,

Deixem-me sair comigo e que me não bata, porca 
A suavidade, a um portal, é lugar de cativo a derrota,
É um vício, e o meu desejo é sentir-me livre, varejo
Quando mijo torto no souto quer pra esquerda,

Para a direita  ou em solfejos irregulares, efeito
Borboleta, para o ar ou pra uma greta, deixem-me,
A substância essencial à vida é um mistério, mas
A busca, o lusco fusco eterno é o que me faz rugir,

Fujo dos escolhos da maré-vaza e do chá morno, 
Da casa, em pêlo e a galope, mais ou menos às cinco,
Cinco da tarde, da tarde mansa e me lanço no sublime 
Trilho que é pra mim estar vivo e fugir por'í "ao vivo",

A galope e em pêlo ...






Na minha terra não há terra






Na tesão pálida do mármore ou do granito róseo tenho
O que posso chamar de mística em pedra gasta pois não
Tem luz interna uma estátua, apenas sombras sem janelas
E a ideia de serem realidade e tributo raro entre belo e lívido.
Na minha terra não há terra, sou dum rebolado chão em barro, vivo

Num não sonhado palácio em forma de oito, habito alcovas planas,
Esposa e cama, esqueci fama, ess'outra criatura investida
Rainha que trocou minha boca por outra breve forma cana,
(sensação é aviso), porém ao fim e por palavras minhas
Ouve-se a serra a serrar um Teixo, amargurado tombo

Sem vida, ridículo, num canteiro sem músculo, areia dormente
É musgo, como se fosse presa que se prostra prá goiva torta,
Morta cega. Incestuoso sentir do vime ao vento, magia,
Instinto d'vidro, corpo e asas d'xamã, septo largura do ânus
De um Druída, odor de terra bolida, ranho é baba, amígdalas

Na nuca, (nunca compreendi o porquê da culpa) córneas
De sapo, na minha terra a vida é de um por cento incólume,
Noventa e nove, placebo dourado à vista de fulano e demente,
Neblina, na minha terra não há vida, nem pode haver Rei consorte,
Ironia é o destino não ter forma humana e a Terra não ter manto,

Gente sem mando, em barro cão com a ideia de ser de verdade
A Terra e deles, eu então ... eu donde sou nem sei se o sonho é meu,
Nem sou tampouco donde venho, (clandestino da alma humana)
Haverá alguém como eu que infinitamente se despe da impressão
De cá estar e se crê existir sem vida nem tempo, sem terra e sem ar.





Jorge Santos (Junho 2020)




“Hic sunt dracones”, A dor é tudo …




Sinto na desilusão uma pedra alçada,
Como papel de embrulho amassado e velho
E o erro que é ter inveja de um cego que vê
Meio muro por uma fenda, pro qual a dor
É purpura, não do vinho, mas de sangue sujo
E uma pedra afiada, um torno e a angústia
Como uma espada de ferro romba, na boca
Cuja serviu de ponta dos pés e a língua de
Vime, como monumento ao que outros dizem
No garrote à vergada populaça infame, vil
Inveja, doença de superioridade sem cura
Pra derrota. “Hic sunt dracones” e aos vendados,
Que atrás das hordas marcham sérios,
Cobertos de escaras iméritas, inéditos Drusos,
Sem nação nem calçada régia, mundo de betão
Herege, onde encostas a barriga de encontro
À parede que julgas consciente, Acabas tu
Como a Lua, a sombra é crua, o mundo
É tão perfeito visto de cima, quanto cruel
É a cinza e o holocausto, que só tem um lado,
-Que fosse o que não é possível ver-se,
Sinto a desilusão como destino e a afeição
Como o azeite para a água, indiferente
Esta alma que nem aceita nem sente, a única
Maneira de não sentir nada é perder e acabar
Sorrindo pra palavras que nem conhecimento
Precisam de ter, nem talento pra mistérios,
“Hic sunt dracones” repetimos fundo e o
Senão do “sei explicar tudo”, sem a humildade
Do apicultor nem a condição do incógnito
Que se revela, tal como uma abelha flutua
E a falha no voo, o paradoxo da fiabilidade
Lapidado nos que passarão por nós, noutros
Séculos e a ideia de morte, donde ninguém
Voltou com exéquias de Filisteu,”príncipe do luto”.




O avesso do espelho...






Basta querer eu alguma coisa pra que morra por ela mesmo,
Assim o respeito que tenho por todos, pior que por mim próprio,
O estranho é que, na classificação que me dou, baixa e “fascia”,
Não me caibo, nem me basto de afirmar pra ser respeitado,
Sou suspeito da dupla significação no que digo, penso e faço,
Dispenso qualidades alheias, sobrevivo do instinto como se fosse
Eu uma industria de criação própria, pouco original e o mercado
De interesse fútil, decorativo painel de “moiral”, moral opinativo
A duas dimensões, para parecer ser escabrosamente humano,
De compleição estéril, assim o respeito que tenho por outros,
Simplesmente porque o sol se põe a leste e não a oeste dos
Ombros desses, meses sem conta, sem autenticidade e enquanto
Os pulmões virados de latitude ao norte, os rins apontam,
Tal qual a minha atitude perante Deuses que desconhecem
Pelo cheiro a natureza das flores e a dor dos opinados ciprestes
Altivos. A respeito das sensações próximas, pouco há a dizer,
A não ser o que falhou, loucura seria afirmar-me como a metade
De cá do destino, pois se morrerei como tenho desde sempre
Vivido, sem respeito por mim próprio e muito menos pelo
Próximo. A Ode Triunfal é um mito longe do Arco do Triunfo,
Assim como o crucifixo não é símbolo apropriado num ateu,
A propósito de proficiências mágicas e alquimias sulfúreas
Complexas, subterrâneas galerias onde tudo se paga em metal,
Basta querer na ruína e na morte pra que haja submundo,
Não se aplica a sombra ao vazio, nem se explica o vazio,
Ainda assim respeito a urgência e a insurgência senão
Como velcros da ilusão na mudança, odeio as maiorias e as
Fórmulas hierárquicas monogâmicas erigidas num padrão,
Respeito a emoção se for natural e não em função do estilo,
Digo o que penso e o riso é uma possibilidade lúdica ela mesmo,
Antes que morra e a espontaneidade em mim afunde, como
Um prego e a variedade de sentir, a mecânica do espirito
O desassossego místico, necessidade vital e suprema de dor,
A aceitação sem submissão, sentindo como bafo no espelho
Do que estou falando, o que estou dizendo e o avesso …



O Amor é uma nação em risco,


 


Em Viena “bailaré” contigo … e os cisnes,
Sinto no amor uma sensação de risco,
Amarelo mosto, decadência e outros mornos
Sentidos, são mero desconforto, descoloridos
Como qualquer outro ante a incrédula dor.
Em Viena “bailaré” contigo, de novo
Às dez para o meio-dia em ponto e antes
Que venha a noite, a velha noite de viés,
Olhar atrevido desafiando o dia, este
Ainda embrião mas com todos os sonhos,
Simpatias e insultos que dentro, no rosto visto.
O Amor é uma nação e do risco, os estrategas
Dos sítios que o digam no “frente-a-frente”
Ao vivo, num “Reality Show” colorido,
Cor do desgaste e de outros detalhes
Irreais por excesso, por exemplo, nos cristais,
A nitidez da claridade conforta os sentidos
Dos mais cépticos, todos os outros estão
Em perigo, propícios aos estranhos esteiros
De alma, estrábicos desejos de nação, videntes
Postiços quanto palha molhada queimando
Lenta, apagada, morrão. Sinto na chuva
O chorar de uma carpideira melancólica,
O som da chuva é o êxtase, abafo,
O tapete da Pérsia, a minha consciência
De Eslavo sitiado, em “Braile” bailarei a valsa
Da meia noite nos píncaros da Catedral
Mais alta na “Cidade dos Signos-Sentados”.
(Sendo quem não tem direito de o fazer)




A Morte não é Bem-Vinda …




A morte não é como a vida,
Mas o sentimento fluído, vívido
Em que nos sonhamos vivos e
Esquecemos o porquê de não
Existirmos de fora da ilusão
De estar vivos, vivendo mortos
Resta-nos sobretudo o talento de
Sonhar o quotidiano e o banal,
-O sonho de ser inquilino de uma
Pequena livraria na rua da indiferença,
O ultraje geral na vida que conheço,
É o ignorar repetidamente ou questionar
A derrota, por ordinária
Que seja na morte o afinal,
Ou esclarecido em vida
O soror da dor perene,
Invicta, imortal, poética,
Bem-vinda e com odor a perfeição.
A morte não é bem-vinda,
Emoção é o que ficou descrito
Como coisa passageira, imortal
A esperança, semi-completa
Verdade que nos conforta e descansa
Da tarefa que é estar vivo.
Matéria é presença e a negação
Da fé por oposição estética
À consciência do pensamento
Como tarefa física, grandeza
Da condição de ser humano,
Dividido entre o que me rodeia
E a vontade de renunciar à mecânica
Das sensações mentidas,
-O sonho de ser inquilino de uma
Pequena livraria de esquina,
Incompetente eu, por nunca ter sido
Senão sonho de quem se sonha vivo…




Patchwork...





Neo-Expressionism in Iranian Contemporary Art





Nunca senti tanta e tamanha antipatia
Pelo papel canelado e pelo patchwork
Consistente do plano, conservador
Este que transforma o bílis da vesícula

Em acto sentimental aos piedosos atrevidos,
Inspectores da mente pra quem tudo é quebrado,
Antigo, descrente descontinuado, carente sexual
Ou até mesmo dissidente quanto um sarcófago.

Se na vida pudesse crer-me existente e real,
Duvidaria que no mundo existisse vida assim,
Pois tive agora mesmo,
De rompante a sensação que não há lá fora nada,

Nada existe fora de mim que valha a pena ser vivido,
Por isso vivo por dentro o que posso viver sem mesmo,
Como se fosse eu o único ser vivo desse mundo sem vida,
Sem gente, que nem sei se existe ao certo,

Nem dentro de mim de peito aberto cabe,
Não creio nem é do meu credo, odeio
Acreditar pleno em nada, nem haver no mundo
Uma Paisagem tão árida, tão em ferida funda e frouxa,

Tão temida pelo vento tão gélida e negra,
Quanto esta minha antipatia
Plana, mecânica quanto o papelão canelado,
Inexistente sem Patchwork.






Jorge Santos 01/2020
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Vivo do oficio das paixões






Vivo no ofício das paixões,

É ao entardecer que me julgo mais distante e pando,
Não há lá nem cá, nem cá estou, menos estou lá, sempre
Estou onde me penso mesmo, não por estar pensando,
Mas porque me lembro ao pensar, do que sei e sei sendo

Esse pensamento, como sendo de ninguém daqui, nem d'além
Tampouco, esse alguém que passou pra outro lado, passado,
Fumo, vantagem de uns poucos o pensar futuro, sentir nova
A quinta-dimensão, rápida a mudança de via interrupta para afiada,

Vêm visões sem conteúdo do outro lado, subvertidas,
Amotinadas, despenteadas eclusas de díspares destinos,
Anseio por instantes sem importância alguma, mas não
Que venham sentar-se comigo à terça, numa cadeira

Desdobrável, dessas de praia em verga, eu espetando alfinetes
De Vudu no entendimento, a função de todo o cabalista
É excluir tudo o que sabe para sentir que entender bem fundo
Sem ver o que está pra aquém e colide com o saber fundado,

A reclusão do conhecimento aprendido, como nos falaram
E que iria gerar um mundo novo, ornamentado a cores
De feira, vindo sentar-se ao domingo na missa, precisamente
Às nove e meia de um amanhecer que sempre seria brando,

Vivo na periferia de tudo isto e de tudo o que me liga
Ao real, vivo no oficio das paixões, gozo-as como se fosse
A transmutação de outro mundo em ouro com que se veste
A minha alma ou a inexistência dela, da razão de entardecer

Dos dias, os sentidos não só sentem, também entendem
O que afirmo e me excede apesar de apenas ver com o espírito
E ter perdido todos os outros sentidos, sinto-me medonho,
Como se fosse místico devoto a um Demogorgon da Babilónia.


















Jorge Santos 12/2019
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Como morre um Rei de palha...









De futilidades e empatias tenho a aorta cheia,
Mas quando o céu morre e o frio se torna cinza,
Cai em mim um véu, que é mais magro que o cio
E do que o altar vazio - o mote de acabar o dia -

Se pudesse retiraria o coração amanhã e pela frente,
Para de repente, voltar a ser gente que nem fui,
Foi-me retirado pelas costas, por ironia e pela
Folha de um punhal estranho, de ferrolho velho,

Virei depois saldar as minhas dívidas de jogo,
Desde as bem maiores às mais mínimas,
Que a fé na sorte faz esquecer, Orixá me perdoe,
Pois nem outro vício tenho, jogo de manhã,

Até à calada da noite, amanhã cedo não haverá magia,
Nem nos reconhecermos, tampouco nos perceberemos,
Somos simples corações humanos, postumamente
Criados por um Senhor morto sem pressa,

Com a clarividência de um Sultão da Pérsia nado-morto,
Deposto pela simpatia de um fraco e gordo, inútil
Até ao sobrolho e sobre ele todo, disse-me que morrerei
Só, que é como morre um rei de palha, em pó...






Jorge Santos 12/2019
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tradutor

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