Cego debruçado em via-estreita



Há palavras de vulgar despojo,
Pois porque o normal é dar, logo
Eu me dou, de mim próprio, tal
Como choro ou respiro e me redimo, 

Mortal despojo, nome de guerra, nojo,
Guerreiro de latão, charlatão, só de incerteza
Tenho pose chaves e certidão; desejo é
Bom-porto, Porto-bom tem Zenão,

O silêncio é absurdo e o meu espírito
Paira longe ao longo, pois já não é só o pensar
Que me foge, eu que fujo de me pensar
Morto e mudo, cego debruçado em via-estreita,

Consciente da derrota, fama é lama e o facto
De ser dissemelhante a algum outro
Espécime de peixe-monge, faringe desfeita
E traqueia, difíceis de engolir, de pesar,

Há palavras de vulgar despojo, nojo
Porém me dá a fala sem emoção, "fio-prumo", 
Por isso choro, quando respiro
De fora para dentro...e me dou,

Cego debruçado em via-estreita e oblonga,
Vivo metaforicamente falando pra fora 
E me queixo não por intenção mas por despeito,
Cedo por entre a prega do beiço, essa sim,

Autêntica, sábia, cega e verdadeira.







Jorge Santos 01/2019
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Ou eu me não chame de Antônio ...





Ou eu me não chame de Antônio,
Nem de António Manuel.

Sou o antónimo dos argumentos
E ideias, dita meu próprio coração,
Qual é a paisagem certa e a época
Do ano em que se cultiva o crisântemo,

Ou eu me não chame nem Antônio,
Nem António...Mendes ainda menos,
José Desânimo é o meu incurável nome, 
Pois é, minto como todos os doentes,

Embora tenha consciência disso,
É fundamental pra me manter são, 
Ou eu não me chame António, atento
Ao que resta de humano em mim,

Tão só, séptico diante da censura,
Quando falo por imagens, sou capaz
De falar livremente e sinto pelos 
Intestinos, com toda a sabedoria,

Ou não me chamasse eu, António
Manuel Eliseu ...











Jorge Santos 12/2018
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O mar que não tem a Lua ...




O mar que não tem a Lua,
É real não tanto quant'eu,
Nela me vejo, aquando prenhe
Ou Luar-meio e aí perco a dimensão

Do real da Lua, que praias
Nem tem, nem areal serei eu,
Sou alguém que se esconde nela, 
A pluma e o medo do lado-escuro,

Que presumo teve algum
Cosmonauta num fato preso,
Tanto me pesa ser súbdito,
De um Mundo em que "à vista",

Nada tem que se diga ser meu,
Ou só minha, quanto a maré
Da Lua é, em toda a volta eu e
Só eu, um Mar sem Lua é breu,

O mar que não tem a lua,
É porto-seguro pra nau d'fumo
Em que viajo sem nau, nem partida
Do areal onde fundeei meu reino-em-

-Meia-Lua, defunto me acho, seu
Lugar comum, bora iníquo,
Líquida a Lua, que mar não tem,
Julgo eu temer a conclusão "de-fundo"

-O Mar não ter Lua, a Lua não ter mar,
O luar ser só meu ...









Jorge Santos 12/2018
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Despido de tudo quanto sou...





Andei distraído procurando o que não via
Nem vejo, visto que sou pequeno, 
Viro o rosto pra de onde venho 
E não pra onde fui posto, 
Vejo nas estrelas o rosto, 
Não da morte mas do oposto, da vida
Pra'lém do percurso que fui, fiz nesta Terra

Outrora bela, soberba ...
Outrora viva,
Andei por aí buscando o repouso,
Não via nem vejo, a fonte do limo, 
O álamo esguio,
O negrume do teixo, da terra preta o apelo,
Das folhas mortas,

Abdiquei de ser rei,
Pra ser jardineiro "por conta própria",
Sem reino nem terreno pra arar,
Podei as rosas dos quintais dos outros
E observei pardais nos ninhos,
Nas sombras os olivais dir-se-iam deuses mortais,
Não contei quantos, mas muitos, muitos.

Há muito que desejo desertar,
Mas as pernas na beira da estrada, 
Estão sempre fora de mim e o meu coração ... lento,
Lento não dá pra fugir por aí de rastos
Admito não ter dormido todo o tempo do mundo,
Mas mesmo assim penso como se fosse madrugada
E domingo, cada vez que me levanto

Sem vida e me mudo pro outro lado da cama,
Na mesma fronha que uso desde que vim ao mundo,
Sinto um ritual de vencedor num corpo derrotado,
O que muda são apenas os sonhos que persegui
Sem sucesso ao longo do tempo
E ainda sonho sonhos que não sigo,
Acatei a derrota,

Sinto um ritual de vencedor nas asas
E nas pernas o símbolo das coisas
Que me pegam ao chão terreno,
"Rocket-man", visto que
O meu território é de ar,
Balouço-me na fronteira do tudo e do nada,
Qualquer um desses reinos me conforma,

A memória passa sem se ver, sem se dar
Sonhar é não estar presente em nenhum Destes países
Pra sempre,
Duvidar é dar liberdade ao voo ...
O plano é adormecer descrente,
Desnudo de tudo o que sei,
Despido de tudo quanto sou.














Jorge Santos 11/2018
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Subtil ….



Subtil o que sofro,
Quero sentir de outra forma pois sinto
Em forma de nada o meu querer,
Falta-me o oscilar do salgueiro ao vento,
Falta-me o sonho dentro do sonho,
-Fala-me da realidade curva e as cores,
Da forma que tem o tempo sem ter,
Em forma de álamo o meu querer …
Paisagem num quadro, uma subtileza
Em cristal, um átomo a oscilar no tempo,
O espaço, um intervalo nulo, o meu ser
Embala-me no vulgar soprar – o ar,
Poeira inquieta o que tenho e não quero,
Milimétrico eu, vulgar sopro o que penso
Ser viver neste viver sem vida, que quase 
Toco sem que me toque ela outra …
Falta-me a sensibilidade negra do corvo,
Fala-me da ausência e da conclusão do dia,
Da hora tardia, fala-me da promessa
Não cumprida, do sermão e da dúvida 
Necessária pra nos mantermos espíritas
E em forma de ar, o nosso ser sitiado,
Enfermo e em forma de nada mais 
Que ar e ar, de mar cercado e sem saída.
Quero sentir-me de outra forma que não preso
Ao corpo nem à vida, sútil ao sopro,
Subtil é o que sofro.

Sofro por não ter falta ,




 
Sofro por não ter falta,
Ausência se faz sentindo
A mesma falta, a partir
Do que não é preciso,
E só dói ao principio, 
Eu sofro por não ter falta,
Medito a sós comigo, 
Repetindo o mesmo “mantra”,
Vezes e vezes sem conta,
Ausência só faz sentido,
Quando há em uma parte
Do corpo, transição.
Eu sou um quarto do caminho,
Desconheço os fins
E a distância, a atitude
É uma doença contagiante, 
Congénita, tal como a má morte,
Estou morrendo de conteúdo,
Como morre mudo um pato,
De desmérito, pode ser fraca
E inoportuna ou tamanha, 
Sofro por não ter falta,
A felicidade é rara e falsa, a alma não
É minha …nem é dada à sorte.
Sofro por não ter falta,
Finjo, ignoro, sou feliz
Como quando se nasce,
Ausência se faz sentindo,
A morte não se sente,
Embora faça parte do que sinto,
Falta-me do voar a asa e a verdade,
Os deuses não me deram uma,
A outra não a quero,
Não me cabe escolher qual delas minha, 
Sofro de não ter falta,
Sofro de ser agora, já tarde …

Temo as sombras e o burburinho …




Temo as sombras e o burburinho … 
Temo as sombras e o burburinho, 
Temo este mundo e o outro, 
O novelo sem roca e obra feita,
Temo o que é invisível e o que vejo,
Novela, enredo, falso pergaminho,
Levitável o monge de Damão na Índia,
Lamentável a minha condição,
De temente a Deus e não aos espaços
Grandes, quanto os desses. 
Miseráveis as palavras que deixo,
Temo o burburinho e as ombreiras
Das portas, as ruas aos “esses”,
Às vezes surge-me na ideia, o que
Estou sonhando e quase toco 
Nos sons do outro lado, embora
Seja uma sinfonia complexa, 
E os anjos tão reais como qualquer
Um de nós, anunciando o privilégio
De serem divinos, seremos quem 
Nos representa, a obra feita,
Salvo o facto de existirmos,
Entre sombras e burburinho.
Sombra de choupo não é mogno, 
O vácuo não tem consciência de broca, 
Nem a esperança é negra,
Como eu dizia inda agora plo caminho,
Por mais que pertença a este, 
Sinto o outro, não o repudio…

Ridículo q.b.




Há música na palavra dita…
Há música nas palavras ditas,
Não ouso cantar
Em publico, sinto-me ridículo
Quando dou por isso,
Estou a cantar alto sozinho, 
pois que o hábito não faz
O monge e eu canto como maldito
Da rua, embora não seja cego,
Sou louco quanto a loucura
Que me habita por dentro,
Sendo esse o meu desatino,
Quando dou por mim sozinho,
Cantando baixo, baixinho.
Sou ridículo, sinto-me músico,
Sem ser nem isso, q,b.
Um sem ofício, fulano tal,
Maldigo o ruído que faço,
P’los cantos da boca sujos,
Como se não bastasse sab’a gemada,
A língua batendo constante,
Nos dentes fingindo ser harpa.
Trinta destinos tive à escolha,
Nenhum de ser poeta, quanto
Menos músico eu, etc, etc, etc …

Tenho sonhado desperto …





Tenho sonhado muito,
Tenho sonhado desperto,
Estou cansado de sonhar
Mais que ninguém do mundo
Ou deste perto, desespero,
Resta-me tentar dormir,
Ter todos os sonhos do mundo,
Recordar acordado certos sonhos
É esquecê-los
Porque esquecer é recordar de novo
Depois de ter sonhado tanto,
Tanto tempo acordado
Mais que alguém no mundo
Deste lado, desespero
Tanto mais que ninguém sonha 
Sonhos perfeitos dormindo,
Desperto …

A verdade é Tenente …Tio Lawrence.



Teu “Lawrence”
O viver Almirante, 
A verdade Tenente,
Capitã minh’alma,
Venho ao mundo
Temente, tamanha 
A sede de viver, gigante …
Almirantes, todos
Que o mundo possa
Conter, dementes vivamos
Capitães da areia,
Fundeemos castelos,
Quer sejam ou não âncoras
De verdade, nem os barcos
Rabelos, os portos-Porthos,
Dromedários, caravelas, deserto.
Teu “Lawrence”, tio Lawrence…
(Vontade Tenente)

Como paisagem ao morrer o dia, o voar do ganso…





Como paisagem ao morrer o dia, 
Tudo se esconde em sombra e erva esguia, 
Assim parece o tacto e o chão ermo
E falto, que me larga a mão e parte 
Na passagem do fim, para o norte fundo,
A chuva não vem longe, vem de través, 
Me segredam os dedos, ralos os cabelos
Que penteio, por dentre dez mil deles, redondos
Como a paisagem, o horizonte e a morte
A chuva não vem longe, acredita profundo, 
Acredito nos homens que não morrem de vez,
Acredito que o “Homem” não morre hoje,
A Terra está doente, não me embala
E eu sofro pelo mar em volta e em luto,
Pla Terra, pla flora e a chuva não vem, 
Nem chora, assim padecem meus olhos doendo,
Doente, eu e tudo, tudo se esconde 
Em sombra e erva podre,
Como paisagem ao morrer o dia, o mundo
Enfermo, tal como entre duas espadas
E o punho, a parede de ferro e brasa,
O feno, o funcho, o abrunho, o ouriço…
O voar do ganso mudo. 


“Entre duas aspas”





Ficarei a ser, sendo o que entendem que digo,
E de mim, enfim é o que consigo dizer entre
Aspas, digo-não entendo tanto quanto quero-
Porque haveria de querer eu, seria sério sendo,
Isso não sou, por aí não vou, passarei por 
Mímico, sendo o que não sou, – entendem
O que digo, pois eu duvido mesmo a sério
Da minha certeza toda e aposto na duvida,
É um vício o ser quem não sou, a razão 
É simples e natural como todas as coisas,
É o que consigo dizer não dizendo, “dividando”
O seno pelo humano interno intenso, sendo
Ficarei a ser o que entenderem que sou,
Gradiente de cinza, incompreensível voo
De moscardo sem voo, necessidade de nada
Ser, destino imaginário ou o que possa ter
Entre aspas “à míngua desse dom”, seco, indivino. 
Perdoai-me, pois não me entendo nem m’dispo
Quando por vezes me “desdigo”, “dividando”
Seno Coseno hipérbole, eloquência de Fibonacci
“Pro bono”, contradigo-me sendo o que não sou, 
Dando o que não tenho, ocultando por onde vou
Paradigma este sentir sem ser voar sem asas ter
Lembrar pra esquecer passar sem mudar pés
Nem mãos do lugar suposto que ocupo na sala
Menos-oval do mundo, enfim, é o que consigo
Dizer “entre duas aspas”, entre duas águas
Sinto que entendem não de facto, o que digo …

tradutor

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