Dramatis Personae





Dramatis Personae

Sinto-me alegre e triste,
Mas não é bem tristeza,
Idêntica é a alegria, nem
Alegre nem contente,

Falsa, também não
Creio, talvez fictícia a
Máscara que pretendo
Usar, essa sim genuína,

Porque é minha a fingir,
É o que eu sou – enganador,
Fingindo alegria estando
Triste, tristeza íntima en’mim

Não é tristeza, mas
Pedaços de outros pedaços,
Episódios de outras almas
Anexas à minha,

Excertos onde cultivei
Outras manhas, sensação
De euforia e desalento,
Cabe a minha morte

Futura lá dentro sim,
Assim como a lembrança
Revista de tudo que é
Humano e pouco,

Vontade é outra
Coisa, assim como derrota
E fracasso, desalento,
Ouro falso, falta de carácter,

São as máscaras que uso
No dia a dia em espaços
Abertos, tão legítimas
Quanto ridículo é o trajo,

Argumento sempre igual
Dos dois lados e igualmente
Reais são as outras dimensões
De mim próprio no palco,

Autor- intérprete, toda-
A parte, autêntico- falso,
Ninguém- tod’a-gente, lugar-
Nenhum, real-imaginário,

Ingénuo-perspicaz …

Jorge Santos 19 Novembro 20/25

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O sonho de Platão ou a justificação do mundo

 




O sonho de Platão ou a justificação do mundo

A vida completa-se em cada um de nós num breve sonho de conquista, somos o sonho da matéria, somamos símbolos, metáforas e representações que nos substituem, juntamos mistérios para nos explicarmos e justificarmos religiões, fés e credos, à sombra de uma terna luz solar, de uma eterna soma de desleais explicações patéticas (que não nos explicam), de sonhos legais, desejos lícitos e formidáveis ambições.

A expulsão do paraíso e a expiação do mundo, são duas dessas fábulas fantásticas em que lei, ordem e doutrina se justapõem acerca do arrependimento filosófico e voluntário, de reconciliação ritual de metanóia espiritual.
Assim o sonho de obediência, a observância das leis da cidade de Platão, que ele mesmo ajudou a redigir a defender, e a fazer respeitar, de enfrentar a ansiedade e o medo da morte de não responder a uma injustiça com outra que seria a fuga, dizia ele segundo Aristóteles, seu mais proeminente discípulo, acerca da importância da alma e da necessidade de se cuidar dela assim como do corpo físico, assim como o bem e o mal não se podem dissociar assim também o conhecimento, a verdade e a purificação são inseparáveis, o nosso eu, o meu eu.

Bem que verdade e virtude nos nossos dias tem as “portas da percepção” fechadas, encerradas mesmo, muitas pessoas confundem verdades e factos com falsos axiomas virtuais e intencionalmente mal manufaturados placebos..

“Embriaguem-se porra de vinho de poesia e de virtude”, disse Baudelaire “Les Fleurs du Mal”. É uma escolha literal, o integral elogio do fracasso humano, a exuberante aquiescência do conhecimento o qual, embora não me explique, mas distingue do tecido de sarja, distrai para poder extrair da imponderabilidade a mais pura intensidade embrionária e visionária, sonhadora. A poesia é o começo de tudo, do pensamento e até da ciência do conhecimento por isso não a podemos vulgarizar, enfraquecer. Suponho que em Atenas não haveriam redes sociais mas apesar disso a democracia não morreu anémica embora ainda embrionária e foi a convite de Sócrates a que nos mantivéssemos lúcidos, contemplativos não obstante a estupidez tacanha coerciva e colectiva.

O fogo tem perdurado desde que a primeira tocha se acendeu na escuridão, assim é o entendimento apesar de todas as vicissitudes, muitos têm opiniões mas poucos muito poucos carregam o facho, têm senso, a coragem da avaliação critica e analítica, poucos têm coragem para pensar diferente e se distinguirem da manada, têm um custo todos e quaisquer actos de rebeldia e o facto de pensar que nenhum algoritmo hoje em dia ainda conseguiu igualar, o espírito que nos fez e produziu criativos, desajustados, insurrectos e os menos correctos.

Estarmos sós no universo ou não, é igualmente assustador segundo Arthur C. Clarke , o universo deveria pulular de vida inteligente não obstante aqui na Terra e nas cidades que tanto valorizava Sócrates deixou-se de ler as estrelas e de observar a relva a crescer nos canteiros, criou-se um paradoxo entre premissa e falácia, dissimula-se astuciosamente e o inventado cria metástases difíceis de combater num formigueiro onde todas as formigas são rainhas e se contaminam mutuamente sem reagentes ou antibióticos.

O desaparecimento do pensamento critico nunca tinha acontecido, excepto nos últimos tempos desta sociedade supermoderna, talvez pelas solicitações interactivas que possuímos e nos influenciam negativamente. Nós somos lobos solitários, elefantes e não abelhas ou formigas e nunca 1984 de Orwell foi tão actual, não nos podemos deixar controlar por opiniões ou plataformas, sejam elas quais forem sob pena de silenciar a liberdade individual e colectiva.

“Basta não ter escrúpulos Moraes” morra o Dantas, o Dantas é um paneleiro, o Dantas cheira mal da boca, dizia-nos Almada Negreiros resta-nos a responsabilidade de dizer, O DANTAS era um homem sério, porque dantes havia seriedade e respeitabilidade. O Dantas era um homem a sério, tinha importância vital alguma, como não têm agora milhares e milhares de semi-cidadãos e cidadãs, senão milhões de indivíduos, pessoas que pouco pensam e não pesam na estrutura social, são como lixo nas nossas sarjetas imundas de falsos oradores, adoradores de opiniões rasas, cobradores de promessas num mundo promíscuo, cheio de pragas e reservas ao qual eu me reservo e me tento preservar enquanto me deixarem fazer perguntas difíceis como estas -somos ou não seremos o sonho da matéria – não ter medo da exclusão social numa sociedade de placebos e patetas, não silenciar a liberdade e a responsabilidade de dizer e a levantar questões por alíneas “aos imbecis aos párias aos ascetas aos Lopes aos Peixoto aos Motas os diabos que os levam , os Mattos, os Gaiveus de Albuquerque E TODOS OS DANTAS QUE HOUVER POR AHI!!!!!! ah, E AS CONVICÇÕES URGENTES. Morra o Dantas Pim PAN pum”

Voltando atrás no tempo, muito antes da revista Orfeu, do “manifesto Anti-Dantas” e da critica da razão pura, do antidogmatismo revolucionário e “Coperniano” de I Kant, qual diz que conhecimento não é apenas uma recepção passiva de informação, mas um acto puramente racional de interação e experimentação. Galileu Galilei, ao contrário de Sócrates o qual preferiu morrer para salvar convicções e à posteriori as nossas também, retrata-se desta forma sensata,
“Eppur si muove”,contudo move-se, a minha pátria é a mãe língua e não pretendam que não a utilize, não a mova também desta ou de outra qualquer forma, em liberdade pois, no entanto, ela se move em fase contraria às mentes vigentes, em movimento retrógrado, a contraciclo ….


Álvaro de Campos

As mortes, o ruído, as violações, o sangue, o brilho das baionetas…
Todas estas coisas são uma só coisa e essa coisa sou Eu…

Outubro 20/25

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Jorge Santos /Joel Matos

Sal Marinho, lágrimas de mar.





Eu próprio sou, não aquilo que perdi,
Mas aquele que perto de ser não foi,
Fingi “de sê-lo”, fugi do quer que seja
Narrável, simples dói, mas nã`tanto

E a queda, mais suave impede-me
Cair parado na minha capacidade
Limitada e finita, aliás um baixio
Nas águas que secaram da Núbia,

Sendo agora o Nilo que me empurra,
Chuva parada, porque não ele-eu,
Pois não sou eu quem fala, mas outro
Que nem eu próprio sou, que s’cuto

Com o pensamento, mas o instinto,
Assim como uma mesa grand’posta
Com tudo quanto sinto ou senti, grito
Assim como se me tocassem do além,

O aço nem é tão frio, o brilho alucina
De forma que eu próprio sou e sinto,
Dor agonia, contentamento descontente,
Descontinuado ou continuamente,

Perto do fim céus marfins, montes claros,
À minha frente pacato, um regato
Descreve a espaço que separa do mar
Os meus ramos magros, sal marinho,

Lágrimas de mar…

Jorge Santos 25 Outubro20/25

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Meia hora triste

 




Triste meia hora

Triste meia hora insurrecta,
Fixa no mostrador e por baixo,
Apenas eu não me
Fixei correcto, nem sei que fuso uso,

Fujo de me fixar,
Nem me agrafo
Ao fluxo do tempo,
Fujo do que conheço,

Vivo da má conclusão da hora,
Como se fosse algo
De sobra que se deita fora,
Assim como as ditas horas meias,

Certas vezes em que me desculpo,
Não sei explicar como nem porquê,
Sinto o sonho fixo, definido
Em unidades de tempo

Assim como eu de cabeça
Baixa, tão baixo que nem me reconheço,
Quando passo por mim mesmo,
E me vejo do lado avesso

Da hora boa …

Jorge Santos (04 Outubro 2025)

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Às vezes vejo o passar do tempo,



Às vezes vejo o passar do tempo,
Que é só o que tenho,
Quando estou a sós comigo,
Longe das coisas que não entendo,

Depois penso como seria bom ouvir no vento
O pássaro de corda embora nada tivesse
Pra me dizer cantando,
Que não diga eu respirando ao som mecânico

Deste meu coração de “ponta e mola”

Jorge Santos (04 Outubro 2025)

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O Ser Português

 




Cumpra-se o fado

O Ser Português

Cumpra-se o fado,
Se a emoção for profunda,
Cumpra-se o fado
E essa mesma dor desolada,

Cumpra-se o fado
A titulo póstumo,
P’la rua das pretas,
Ou na s’quina próxima,

Cumpra-se o fado,
À minha janela pudica,
Como se fosse trágica
A alma da noite pálida,

Cumpra-se o fado,
Numa dor perdida, no Tejo,
Na tasca das putas,
Tendo do remorso,

Uma “mea-culpa”,
Cumpra-se o fado,
Por sobre as colinas,
Sete, onde o ar fede,

Pra que sintamos
Sinceramente,
Cumpra-se o fado,
Da medula ao ventre,

Desta gente de coração,
Que ama O Ser Português,
Pra quem devoção, é bandeira …
Cumpra-se o fado,

Cumpra-se Portugal.

Jorge Santos (17 Outubro 2025)

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Mãos que incendeiam sóis,





Mãos que incendeiam sóis,
Sendo eu de pintar incapaz,
Incapaz e sem jeito, ainda
Assim fazendo incendiar,

Incendeio a pouca paz que
Tendo não tenho, estrangeiro
De pai e mãe, ambos lados
Involuntários sem rendimento,

Aptidão, sol a sol é trabalho,
Mãos que incendeiam sóis,
Só eu só não sei o que sou,
Vitral quebrado incapaz ser

Outro, tanto faz se vivo,
Tanto faz se morto, é igual
Não me faço entender, nem me
Entendo velando meio corpo,

Mãos que incendeiam sóis,
Me desculpem por ser eu
Tão débil e quase tão pouco,
Curto o sol curtíssimo eu

Próprio, que como ele me
Não movo, ao contrário
Da Lua cheia, de que procuro
Fugir mas não fujo, não fujo…

Não fujo, não luto, não luto,
Incapaz de ser, não sei …
Um qualquer outro que não
Eu mesmo.

Jorge Santos (20 outubro 2025)

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Não sendo águas

 


Não sendo águas

Não sendo águas,
São fontes vivas,
Sons audíveis,

Saudosos montes,
Amantes descalços,
Terras de conto,

E eu recolho a casa,
Naquele palácio morto
Que não meu,

Nem meu é o outro,
Vento e céu,
Idas coisas,

Perenes vidas,
Perecidas águas
Não sendo mágoas,

São vivas as fontes,
Fontes de vida,
Audíveis sons.

Jorge Santos 24 Outubro 20/25

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Recordo a papel de seda

 




Ou o sonho da borboleta

Recordo a papel de ouro
E seda, seja o que for, seja
O que sei, seja o que invento,
Sinto tudo pelo toque,

Até a respiração, um sinal
Sonoro, um som brando,
Branco como a maré e o ar,
Recordo-a pelo rasto,

A maresia e a brisa prata
Com que arrasta a alma
Minha e quebrada p’la s’puma,
P’la rebentação da maré alta,

O tango no voo de uma
Gaivota presa ao vento,
Recordo-as em papel almaço
Mas leves como lamento,

Mais graves que o sargaço
Negro/preto/baço, humano
Sonhando-se de borboleta,
Assim pudesse eu ser sonho,

Qualquer coisa mais dúctil,
Moldável, papel d’embrulho,
Lenço, fita d’laço, cartão.
Recordo a papel de seda …

Jorge Santos (16 Janeiro 2025)

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Percas, Carpas …

 




Percas, Carpas …

Não as distinguiam do ind’agora, do ontem
Numa febre ligeira, chamavam-lhes de
Graças, milagres ou planícies fora da alma
E aos sentimentos, o que não tememos,

“A apologia de um lugar quiescente”,
Lá fora as Carpas mais se pareciam
Lírios longitudinais, mas presentes e
Legítimas como tudo o mais, pardilhos,

Percas da minha loucura, luar de quem
Se perdeu nalgum tempo, não eu
Embora doendo que seja, fui eu mesmo
Acontecendo “sine-die”, sem honra,

Não me destruiu a diáspora na Terra
Que liga a mim tudo o que o vento
Traz de cinzento e ambíguo nas várias
Viagens que faz até ao fim e eu mudo,

Ignorando tudo tal como uma vespa
Ou o delírio do vazio que me brada
E o vento ao cerzir nos ares a minha
Angústia parda e quieta, absurda

E líquida. Aconteço por segmentos
Como quando se viaja sozinho sob
O branco cinza do céu a quem chamo
De profecia quando o estou vendo,

Prevejo nem tanto, tampouco de fora
Como nos vemos, sonhos e memórias
Que repousam onde antes Reis, Reinos
E Rainhas de olhos esverdeados, carpas …

Percas, enguias, focas.

Jorge Santos (04 Janeiro 2025)

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Entreguei-me a quem eu era



Entrego-me a quem eu era,

Combinação alegre e triste
De claro e escuro, contorno
E forma,

Serei de modo
A não deixar de ser
O quer que fui, assim eu era,
Sendo sou enunciado do que fui:

-Não domino o impulso,
Expresso o desejo, motiva-me
O sofrimento e a qualidade
De não possuir um nem outro,

Sou o perfeito analista genérico
De tudo que não me interessa,
Particular, ou o estoicamente
Simplista por defeito,

Desconfio da verdade,
Da convicção ser ciência,
Considero nada e ninguém
Conceitos antagónicos.

Desprezo argumentos,
Como um bom actor, desobedeço
Ao guião, embora a minha
Opinião varie assim como as texturas,

Têm uma realidade corpórea própria,
Semelhante ao meu pensamento,
Tão pouco real, ao jeito
Ou duma convicção paralela,

Direi mística ou idêntica
Às solas dos sapatos que embora
Caminhem lado a lado, aos pares
Se gastam desigual.

Se deformam conforme o peso
E em função do andar,
Hesito perante supremos
Axiomas, sofismas

Não fazem mais que confundir
O meu trajeto,
Guiam-me à descrença e, na dúvida
Entrego-me ao que eu dantes era.

Jorge Santos ( Novembro 20/23))

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Cedo serei eu




Cedo será o fim da fera, sinto-o
Sofro e sou-o, meço-me salvo-
-Erro p’lo destino, é curto o postigo,
O fio, a fita, trágico o pavio,

Antecipo tudo isso e escuto,
Ouço o sopro como espécie
De grito rouco ou sufoco
Expulso em vapor e fumo,

P’lo meu peito atómico,
Prova do exótico, defunto
Me pressinto e prossigo
Acossado assim como vim,

Sem causa nem fim,
Nem castigo futuro,
Foi o que vivi que me viveu
E o postiço era eu e sou,

Longa era a vida em mim,
Quem a fez minha se cansou,
E eu me cansei do lugar
Que em tudo lembra um lar,

Minha casa e o quanto me dói
O fim de uma era que se foi
Depressa e o que me pesa,
Revolta súbito, de facto sim

Qualquer coisa há de errado
Em mim, uma espécie d’sombra
Um cansaço, um medo sem dor
Nem causa que m’causa náusea,

Horror, desespero seja o que for,
Não me dá sossego, entre
O que é verdade e a negação
Do final de tudo … cedo será,

Serei eu o morto.

Jorge Santos (08 Março 2024)

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Entrego-me a quem eu era,




Entrego-me a quem eu era,
Combinação alegre e triste
De claro e escuro, contorno
E forma,

Serei de modo
A não deixar de ser
O quer que fui, assim eu era,
Sendo sou enunciado do que fui:

-Não domino o impulso,
Expresso o desejo, motiva-me
O sofrimento e a qualidade
De não possuir um nem outro,

Sou o perfeito analista genérico
De tudo que não me interessa,
Particular, ou o estoicamente
Simplista por defeito,

Desconfio da verdade,
Da convicção ser ciência,
Considero nada e ninguém
Conceitos antagónicos.

Desprezo argumentos,
Como um bom actor, desobedeço
Ao guião, embora a minha
Opinião varie assim como as texturas,

Têm uma realidade corpórea própria,
Semelhante ao meu pensamento,
Tão pouco real, ao jeito
Ou duma convicção paralela,

Direi mística ou idêntica
Às solas dos sapatos que embora
Caminhem lado a lado, aos pares
Se gastam desigual.

Se deformam conforme o peso
E em função do andar,
Hesito perante supremos
Axiomas, sofismas

Não fazem mais que confundir
O meu trajeto,
Guiam-me à descrença e, na dúvida
Entrego-me ao que eu dantes era.


Jorge Santos( 28 Novembro 2023)

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No meu espírito chove sempre,




 No meu espírito chove sempre,

E justamente como eu quero,
Chuva triste, anónima a chuva,
Anónimo eu, será que existo nela

Ou ela entre mim e eu. Há um fosso
Cavado e eu parado, curvado
Assomo o poço, aceno, sou eu
Por debaixo no rosto da lua feia

No escuso fundo, meu futuro
Uma nau, pavio apagado, navio
Sem pavilhão sem passado, porto
De abrigo sob estandarte inimigo.

No meu espírito sempre choveu,
Chuva forte corpo enlameado, nu
Por fora e por dentro sem vida,
Inda um riso forçado na boca,

Contragosto em forma dúbia,
Indefinido, a ele fiquei preso,
E à dúvida de eu ser eu mesmo,
Quando me mordo ou m’belisco.

Serei deste ou dum mundo outro,
Onde eu entrei sem ser ouvido,
Ou visto a sair, voltei sem partir,
Pois serei quem sempre fui,

Desconhecido justo com’quero,
Brisa ou vento, nuvem sobre
A floresta, por debaixo quem
Me lembra acabará m’esquecendo,

Assim como um caminho rural
Mal calcado, se quer esquecido,
Por não pertencer a ninguém,
Nem vivalma mais por’í seguir,

Quem sabe, por medo …

Jorge Santos (23 Novembro 2023)

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A essência do uso é o abuso,




 A essência do uso é o abuso,

O atributo é insignificante, real
É a ideia e o curso dos meus
Sonhos, não a utilidade nem “o ser”,

Sabendo que tenho um fim,
Não preciso dum profundo
Propósito, sou céptico, no fundo
Um descrente d’tudo, onde

Tod’agente outra m’acontece
Com espontaneidade, se digo
Que fui então eu sou sem
Dúvida quem o outro já foi,

Sou naturalmente Íntimo e
Próximo d’quem me confesso,
Um desconfigurado original,
Ouso dizer coisas sem fim

Nem meio, sem jugular
Nem conteúdo inédito,chato
Monocordo até no pensar,
Acordo com a sensação

De continuar dormindo
E quando durmo tod’uma
Nação me pertence, assim
Pudesse olhar-me d’frente

Eu, sonho esquecido entre
Mim e eu, verdade falsa
Aquela em que toco e olho
P’la minh’alma sem vigia,

Pensando ver um mar a sério,
Mar sem fundo nem margens,
Minha realidade é ar, não
Dest’mas d’outro esquecido

Reino sem rei, reinado, amantes
Submissas mas sem vassalagem.
Assim me foi proposto, minha
Coroa, meu Ceptro que não uso

Por fidelidade a um outro
Monarca e Rei deposto
Sen’glória, cuja sombra s/historia
É sem dúvida a minha,

Me espezinha, me retalha
Na cara, nos braços pernas
Corpo e flancos.

Jorge Santos( 21 Novembro 2023)

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Vamos falar de mapas




Ler-te, é como ter ao meu lado,
Um sonho de que vou sarando,
E a paz do mais profundo campo,

E naquilo que sonhe, sonhasse
Seguindo o meu instinto, mas não
Vamos falar outra vez de mapas,

Antes que me faça caminho,
Desses que levam a toda
E a qualquer outra ignorada parte,

Que não seja o desatino ao vivo
Que me falta nos calos dos dedos,
Nos cabelos grisalhos do peito,

No centeio abrindo um trilho,
No milho moldando ao vento.
(Estranhos recrutas cegos)

Hoje falamos de mapas, forma
Promulgada do que outros veem
Como mutilação, ilusão de margens

De um mundo exterior ao seu,
A julgar pelas linhas da mão ao tempo,
E até onde a vida poderá ir, senão

Fingindo que as sei ler, quando
Lhes dou um momento da minha
Particular atenção …

Jorge Santos (Março 2023)

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(Creio apenas no que sinto)



Apenas me sinto
Livre enquanto crítico
De mim próprio,
Como se fosse o destino

Outro, eu mesmo
Juiz sui generis e réu
Do foro privado,
Em guerra estranha

Com os sentidos d’outrem,
Socorro-me do falso
Ouro e do parecer
Mármore, ou paládio

Todo o meu esforço
De crustáceo bivalve
Vivo, bora cerceado
P’la casca à mostra,

Enterrado até ao centro
Do umbigo em estranha
Lama mole, frouxa
Pátria que me força

A ser “tal e tal” igual
Ao apelido ingénuo
Desenhado na calçada
Do terreiro do trigo

Seco, seguindo-o me
Segui, porta fora, corpo
Dentro Moniz Mártir ?
Nada me diz Martim,

Valha-me S. Jorge órfão
E uma multidão de seres,
Que não são realmente
Enteados Santos, meus

Aliados distintos, (creio
Apenas no que sinto) …

Jorge Santos (Março 2023)

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Notas de um velho nojento

 




O Trashumante (na primeira pessoa)

Notas de um velho nojento

(parte um)

Houve ao longo da minha porca existência alguns curtos e pouco prósperos momentos de prazer realmente genuíno e em que pude considerar-me lúcido o suficiente para poder auto ajuizar-me ou gabar-me dos meus actos. Recordado e ao vivo, para alguns será condenatório, como estas lembranças de agora mesmo e embora correndo risco de ainda piorar o enxoval, a sordidez e a êxtase do nojo que sinto de mim mesmo como numa mistura agridoce de orgulho miserável, pobre e sem preconceito.
Considero estas memórias cujas antes de mais como um mau hino, um hiato libertador, uma declaração ciente consciente de uma falta de higiene moral, sem cerimonial nem usurpada indemnização de todas as minhas ilícitas, ordinárias e libidinosas ações, não lhes podendo chamar de feitos ou proezas que não escondo, não posso, façanhas são façanhas, não têm nem possuem tão belas ou sujas e desonestas qualidades quanto as que eu a mim próprio me atribuo e me encantam, enojam ou honram apenas e mesmo que só pronunciadas com alguma glória por uma má e reles escrita quanto esta sem estética, harmonia ou beleza, direi que apenas se afigura como da mais fina e refinada flor do esterco, da má reputação ou do pântano lobregue, do logro em que toda esta sórdida, baixa existência se tornou, afinal até os extremos se tocam, indeléveis.
As vielas toscas e sórdidas eram um “habitat” providencial, libidinoso e era nelas que me sentia consumado e em casa, chafurdando na merda, na miséria mais infecta, rastejante. Sentia-me talvez um pouco menor ou ainda mais abjecto se é que sentia ainda algo superlativo no corpo, sob o ralo cabelo, quando saía aos tropeções ou era despejado das imundas tabernas aos pontapés quando se acabava o pouco que tinha para gastar em álcool ou em veneno, sabia lá eu o que era aquela surrapa que destilava pelos rins e que impregnava a pele de cheiro a mijo e a aguardente bera ou falsa numa mistura cacofónica.
Naquela noite fria de Dezembro, lembro-me perfeitamente como se fosse ontem, uma jovem talvez por inexperiência profissional levantou-me levemente do chão com especial carinho ou compaixão, lavou-me o rosto com a ponta do vestido vermelho e olhou nos meus olhos de uma forma tão angelical que me esqueci ou talvez quisesse era mesmo apagar o seu rosto feliz das minhas memórias, quem sabe ela tivesse por momentos esquecido da imundice e dos maus odores a nós próprios e que nos rodeavam, alguns mesmo vindo das rameiras e dos chulos que, como uma fauna nauseabunda, indistinta e vegetal, quase que obrigando quem por ali se aventurasse aquelas horas da madrugada, ao sexo de todas as maneiras, formas e feitios que a famigerada mente humana pode elaborar ou inventar, retorcer.
Perverso por instinto, não pensei uma nem duas vezes, apesar de cambalear tentando endireitar-me nos fracos e alvos braços dela e sem ter o mínimo de decência, pudor ou alguma gota de respeito por algum ou qualquer ser humano, empurrei-a grosseiramente contra a parede grafitada do casario, tentei não sentir dó nem piedade no vocabulário vernáculo, nos palavrões mais velhacos que conhecia e arremessei grotescamente, que ejaculei pelo meio dos dentes em falta e de outros mais que podres. Não sei nem saberei jamais o que é ter dó ou pena por coisa alguma ou por alguém, sentia sim desprezo por tudo e todos e inclusive por mim.
Como quem dobra um submisso animal por gozo, curvei-a pelas coxas, segurei-a pelas axilas e à minha territorial vontade, agarrando-a submetendo-a pelos cabelos mal pintados e encardidos até ao mais baixo que se pode levar contra a seu desejo alguém, usei-a até ser apenas papel mata borrão e mais uma puta sodomizada à traição, de quarteirão barato igual a tantas outras, como era, pensava eu de facto e após o imposto acto não remunerado e criminoso.
Sentia-me novamente tão real quanto repulsivo, abjecto, vasculhando nos bojos das calças sujas, deslavadas do sangue quente da boca da matrona na braguilha, manchado a sémen; procurava pela chave do quarto que se situava mesmo ao fundo dos fundos da rua, numa cave putrefacta, sem janelas e sem limpeza, tão imunda quanto a real realidade dos sonhos de quem realmente não sonha ou nada sente.

O Trashumante (Março 2023)

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A alegria que eu tinha




A alegria que eu tinha,
Era a de descrever
A geometria do que sentia

Nos ombros, dos cantos da boca,
À linha direita, torcida
Dos cabelos, do queixo,

Nos nós dos dedos, da tristeza fixa
E pobre, com o que fico
Me convenço,

È uma maldição rasa,
Que espero em vão desapareça,
A visão estrangeira

Com que me meço
Na ressaca dos outros,
Sendo eu ela própria,

Pródiga não sei no que seja
E só. A alegria que eu tinha
Quando era, como era

Inda’gora, me conforta
Apesar de banal, pouco interessante.
Extraio vida de coisa alguma,

Limitando-me a sonhar,
Embalsamando minhas
Palavras.


Jorge Santos (Fevereiro 2023)



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Quem sou …

 




Hoje é o dia certo

Hoje é o dia certo e exato,
Para vir dizer-te que vale
Sempre a pena ser quem sou,
Nem que seja só por isso,

Por ser hoje, véspera de
Feriado, domingo lento,
Murmurando pra que não
Seja aliterado em falso

Prá semana que vem, ou
No próximo dia santo recém
Criado, não sei ao certo
Quando nem de quem

Me acerca mais de perto
Que a sombra no deserto
Ou o silêncio hibrido que paira
Á porta, morto a tiro,

Silente e frio voo de ave,
Hoje é o dia certo,
Pra desejar o que não tenho,
Ter o que não hei de despir

De novo ao fim do dia, como
Quem nada espera pra definir
Sensações e viver delas,
É hoje o dia perto de tudo

Que há em mim, por fora
Fica o menos autêntico
Que consigo expressar ou
A possibilidade de ser

Quem sou …

Jorge Santos (Fevereiro 2023)




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